A montagem de “Os Fuzis da Senhora Carrar”, de Bertolt Brecht é um desdobramento da pesquisa cultural Transgressão
A pesquisa teve como foco três grupos teatrais do Recife: o Teatro Popular do Nordeste (TPN), o Teatro Hermilo Borba Filho (THBF) e o Vivencial Diversiones.
O objetivo dos pesquisadores, além de resgatar e contextualizar a história desses grupos, foi interligá-los pelo viés da transgressão, uma vez que, cada um deles, à sua época e a seu tempo, foi importante marco das rupturas ideológicas, estéticas e de costumes verificadas na cena teatral e cultural de Pernambuco.
A idéia, que começa a se concretizar com a montagem de “Os Fuzis da Senhora Carrar”, é tirar a pesquisa do papel e, de certa forma, dar a ela vida no palco. Para cada um dos grupos pesquisados pretendemos destinar uma montagem. Para isso escolhemos peças que tenham sido montadas originalmente pelo THBF, TPN e Vivencial e que tenham se tornado referência das escrituras cênicas desenvolvidas por esses grupos.
É exatamente o caso de “Os Fuzis da Senhora Carrar”, encenada pelo THBF em 1978, com direção de Marcus Siqueira e premiada pelo Serviço Nacional de Teatro como o melhor espetáculo do ano
Isto o que pretendemos: provocar a interlocução entre a cena teatral contemporânea e as escrituras cênicas que, em dada época, notabilizaram o teatro pernambucano, provocando rompimentos normativos, deslocamentos ideológicos e propondo novas formas de se pensar a arte.
Agora montamos “Os Fuzis”, projeto, assim como a pesquisa Transgressão
O TEXTO
“Os Fuzis da Senhora Carrar”, peça escrita em 1937 por Bertolt Brecht, está entre os principais textos do dramaturgo alemão, encenado e estudado no mundo inteiro. De caráter antiilusionista, o texto trás à cena aquela que foi uma das maiores preocupações de Brecht, causa e razão da sua obra; as situações de conflito coletivo.
Ambientada durante a guerra civil espanhola (1936-1939), a peça, a partir de um drama familiar, discute, antagonizando idéias, a neutralidade e o posicionamento político. Uma viúva de pescador, a Senhora Carrar, tenta salvar seus filhos da morte mantendo-se neutra numa Espanha banhada em sangue e sob a mira dos generais. Dores pessoais e sofrimentos coletivos misturam-se, brigam, rivalizam personagens atordoados por uma guerra cruel.
O THBF
O Teatro Hermilo Borba Filho nasceu, oficialmente, no dia 08 de maio de 1976, tendo como fundador o diretor Marcus Siqueira. Surgiu como uma extensão do Teatro Novo do Recife, também criado por Siqueira, e cuja estréia se deu em 04 de outubro de 1968, no Anexo do Palácio Episcopal dos manguinhos, com a peça “O Doente Imaginário”, de Molière. Na época, Dom Hélder Câmara era o arcebispo de Olinda e Recife e deu total apoio à experiência teatral instalada nas dependências da Igreja.
Desde a sua estréia, em outubro de 1968, ainda como Teatro Novo do Recife, até a data de sua extinção, em 1981, o THBF montou 26 espetáculos, entre textos adultos e infantis. Sua trajetória, sua proposta cênica e seu alinhamento político, colocando-se como coletivo de resistência à ditadura militar vigente à época no Brasil, fizeram do grupo importante referência do teatro pernambucano.
Assumiu abertamente o papel que, de certa forma, fora transferido à literatura e às artes cênicas, quando a imprensa brasileira foi amordaçada pela censura. Nos anos mais difíceis, com os jornais, as rádios e as televisões silenciadas, e até mesmo o mercado fonográfico tutelado pelos censores, coube aos escritores e aos artistas, e não mais aos jornalistas, a denúncia das arbitrariedades e da violência que se praticava nos porões da ditadura. É nesse contexto que o THBF se insere como um dos bastiões da resistência cultural e política no estado.
Heitor Rocha, cientista político entrevistado pela jornalista Stella Maris Saldanha durante a realização da pesquisa Transgressão
No plano estético era um teatro comedido, despojado, de marcas simples. Um teatro essencializado que sobreviveu à margem da capitalização das produções artísticas, metabolizando em linguagem cênica aquilo que lhe faltava em recursos materiais. Seu criador, Marcus Siqueira, defendia uma escritura cênica rigorosamente amparada na força do ator. Era ele, o ator, a luz fulgurante do teatro. Tudo o mais era acessório que poderia, ou não, ser utilizado. É de Marcus a frase: “Teatro para nós é, cada vez mais, um palco, um ator e uma paixão”.
A NOVA MONTAGEM DE OS FUZIS DA SENHORA CARRAR
Direção: João Denys.
No elenco estão:
Stella Maris Saldanha (Senhora Carrar)
Roger Bravo (José)
Eduardo Diógenes (Voz do General)
José Ramos (Operário)
Ailton Brito (Ferido, Pescador 1, Juan)
Evandro Antonio (Ferido, Pescador 2)
Karina Falcão (Manuela, Mulher)
Alfredo Borba (Padre)
Socorro Albino (Senhora Perez, Mulher)
Antonio Marinho (Pescador 1, Juan)
Incentivo: Funcultura – Fundarpe – Governo de Pernambuco
Produção Executiva: Página 21 – (81) 3421 7180
pagina21@pagina21.com.br
Estréia: 14 de agosto próximo, na lua nova.
Temporada: de 14/08 a 19/09, sábados e domingos, às 18h no Teatro Hermilo Borba Filho.